Um romance baseado na
história real de duas crianças indígenas que morreram após serem levadas do Brasil
para a Europa, no século XIX, deu à escritora pernambucana Micheliny Verunschk,
de 50 anos, a vitória na categoria "romance literário" do Prêmio
Jabuti, o principal do país, nessa quinta (24). Ela viveu a maior parte da
infância e da adolescência em Arcoverde.
Duzentos anos após a
independência, a autora de "O som do rugido da onça" defende que o
impacto causado pela colonização europeia ainda define o Brasil de 2022.
"Acredito que essa
ferida colonial se inflama até hoje, quando a gente percebe ecos, não só dessa,
mas de outras violências que os povos originários e o povo negro e outras
minorias têm passado. Escrever sobre esse passado é também refletir sobre o
nosso presente", afirmou Verunschk.
Micheliny diz que descobriu
as histórias de Miranha e Juri em 2016, durante uma exposição que trazia
imagens em litografia das duas crianças. Embora o texto não usasse esse termo,
ela entendeu a ida dos indígenas para a Alemanha como um sequestro.
"Muitos indígenas,
homens, mulheres e crianças, não só do nosso território, mas de outros países,
foram levados para a Europa, no contexto de circos humanos, de exposição ou de
investigação científica", disse a escritora recifense.
Autora de 12 livros, sendo
cinco romances, Verunschk disse que ficou honrada por ter vencido o Jabuti,
principalmente por ter competido ao lado de outras escritoras que ela admira.
A vitória aconteceu dois
anos depois que a primeira pernambucana venceu o Jabuti, a poetisa e
vereadora Cida Pedrosa, autora de “Solo para vialejo”.
"Eu vejo esse
resultado, de duas mulheres pernambucanas recebendo não só uma premiação, mas
sobretudo uma atenção de leitura do país, como um sinal de que as coisas estão
fora do eixo, de uma forma positiva. Por muito tempo, a gente se queixou de que
o eixo Rio-São Paulo era privilegiado, não só nas premiações, mas nas edições e
na recepção dos livros", argumentou Micheliny.
Para ela, isso pode
estimular outras escritoras. "Acho que isso reverbera em outras mulheres
que estão escrevendo, não só em Pernambuco, mas em outros estados do Nordeste e
do Norte. E reverbera também com essa força, essa pujança da literatura escrita
por mulheres", disse.
Para a cerimônia, que
ocorreu no Theatro Municipal de São Paulo, Verunschk usou na mão esquerda o
anel que ganhou quando foi alfabetizada.
"Isso diz muito a
respeito da minha família, que sempre me incentivou na leitura e na escrita. E
isso diz muito também do meu total reconhecimento e agradecimento aos lugares
que me formaram, às escolas e aos professores", contou.
No próximo ano, Micheliny
lançará um novo romance, também publicado pela Companhia das Letras, editora de
"O som do rugido da onça".
A nova obra contará a
história de uma jovem que vai trabalhar no sul do país e quando retorna ao
Nordeste, após se tornar evangélica, não consegue mais se entender com a
família, que tem outros valores.
"É um romance sobre
como o fanatismo e uma certa adesão a um projeto fundamentalista podem destruir
o núcleo mais duro dos afetos", adianta a escritora, sobre
"Caminhando com os mortos".
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