Apesar
do discurso crítico ao que chama de “velha política”, o presidente Jair
Bolsonaro repetiu uma prática trivial de seus antecessores na relação com o
Congresso e liberou um valor recorde em emendas parlamentares às vésperas da
votação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, aprovada na
quarta-feira passada com 379 votos a favor.
Foram
R$ 2,7 bilhões empenhados em apenas dez dias, sendo R$ 1,5 bilhão em emendas
individuais apresentadas por 550 deputados e ex-deputados federais. A quantia representa
uma média diária de R$ 268 milhões em desembolso em julho, mais do que o dobro
da média registrada em maio de 2016 - R$ 123 milhões -, quando foi empenhado o
maior volume de recursos em um único mês - R$ 3,8 bilhões - desde que a
execução das emendas pelo governo passou a ser obrigatória, em 2015.
Naquela
ocasião, tanto a presidente cassada Dilma Rousseff, que estava sendo afastada
do cargo pelo Senado, quanto o ex-presidente Michel Temer, que assumia o
comando do País, usaram as emendas parlamentares impositivas como instrumento
de barganha política, em busca de votos contra e a favor do impeachment.
As
emendas são indicações de gastos no Orçamento da União por deputados e
senadores, que costumam privilegiar seus redutos eleitorais nos repasses de
dinheiro para obras ou programas. O teto equivale a 1,2% da receita corrente
líquida - R$ 13,7 bilhões neste ano -, sendo que metade deve ser destinada à
saúde. Embora sejam impositivas, é o governo que controla o fluxo de liberação
dos recursos.
Até
junho, Bolsonaro havia liberado apenas 13% dos recursos previstos. A baixa
execução dos repasses era motivo de queixas recorrentes de deputados do Centrão
e da própria base governista. Com a liberação recorde no início deste mês, esse
porcentual mais do que dobrou, chegando a 32,5%, segundo dados do Siga Brasil,
painel de execução de emendas parlamentares controlado pelo Senado.
Os
números mostram que o expediente utilizado por Bolsonaro às vésperas da
aprovação da reforma da Previdência na Câmara é o mesmo adotado pelos
antecessores em votações cruciais no Congresso. Em 2017, por exemplo, Temer
liberou R$ 3,2 bilhões em emendas no mês de dezembro, quando ainda tentava
aprovar sua reforma previdenciária. O projeto não avançou em razão da contaminação
do debate eleitoral.
Seis
meses antes, Temer já havia usado o poder do controle da liberação de emendas
impositivas para conter o momento mais crítico de seu governo, as denúncias de
corrupção, obstrução da Justiça e organização criminosa feitas contra ele pelo
então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base na delação da
J&F.
Foram
R$ 2 bilhões liberados em emendas em junho, um mês após a divulgação da
conversa gravada entre o ex-presidente e o empresário Joesley Batista, e mais R$
2,2 bilhões empenhados em julho, quando a primeira denúncia de Janot chegou à
Câmara. Em agosto e outubro, a maioria dos deputados rejeitou a abertura de uma
investigação contra o emedebista.
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