segunda-feira, 17 de novembro de 2025

CRÔNICA: Política à Mesa — “O Silêncio dos Corredores”

               Há cidades que contam sua história pelos monumentos. Outras, pelas festas. Arcoverde, infelizmente, tem contado pelas denúncias que surgem dentro do Hospital Regional Ruy de Barros Correia.

Os corredores da saúde pública em Pernambuco têm um som próprio. Não é o burburinho dos profissionais, nem o ruído dos equipamentos velhos que insistem em continuar funcionando. É um silêncio — daqueles que gritam. Arcoverde conhece bem esse som, especialmente quem já precisou atravessar as portas do Hospital Regional Ruy de Barros Correia. Ali, onde deveria haver acolhimento, multiplicam-se relatos que ecoam nas redes sociais e nos portais de notícia: mau atendimento, demora absurda, histórias de dor empilhadas como prontuários esquecidos.

Se antes as denúncias surgiam esporadicamente, agora viraram rotina. Basta uma busca rápida na internet para encontrar casos semelhantes divulgados em sites como G1, NE10 e blogs regionais que registram todos os dias queixas de pacientes que esperam, esperam e esperam… como se o tempo do sofrimento fosse tão elástico quanto o descaso estatal.

E então voltamos a Arcoverde, onde a crônica da precariedade ganhou mais um capítulo — desses que ferem o coração da gente. Na última sexta-feira, 14, o pastor Diógenes Dionízio, 52 anos, seguia de motocicleta para a igreja no distrito de Rio da Barra, em Sertânia, quando teve a vida interrompida por um acidente com uma vaca na PE-287. Foi socorrido pelo SAMU, levado ao Hospital Municipal de Sertânia e, pela gravidade do caso, encaminhado ao Hospital Regional de Arcoverde. Lá, a promessa: “Logo ele vai para o bloco cirúrgico”, disseram à família, já aflita, enquanto a clavícula quebrada clamava por intervenção urgente.

Mas no HR o tempo tem outra lógica. O que deveria ser “logo” virou horas. Depois virou dias. E, de repente, o que era aflição virou denúncia. O filho do pastor, David, relatou na manhã do domingo (16) que o pai sequer estava recebendo alimentação ou hidratação adequadas. Só depois da exposição pública é que o mínimo começou a ser feito: deram comida. Sobre a cirurgia? Ainda não há previsão. “Aguardando intervenção”, informa a equipe médica, como se o corpo aguentasse viver de espera.

O Hospital Regional de Arcoverde é um termômetro da saúde de Pernambuco — e o diagnóstico não é bom. A cada história revelada, percebe-se que o sistema colapsou não apenas por falta de recursos, mas por falta de comando. Enquanto os pacientes agonizam, a máquina pública parece girar no vazio. E o que é mais triste: acostumamo-nos a esse caos, como se fazer um escândalo fosse o único caminho para ter um direito básico respeitado.

A governadora Raquel Lyra, que prometeu reorganizar a saúde pernambucana, tem tropeçado justamente no que deveria ser prioridade absoluta. Quando o básico falha — a alimentação de um paciente internado, o acesso à cirurgia, o atendimento digno — todo o resto desmorona, inclusive o teto. O preço dessa condução instável não se paga com números em planilhas ou discursos em gabinetes. Quem paga é a população. Quem paga é o pastor Diógenes. Quem paga são as famílias que estendem a noite em vigília nos corredores que continuam silenciosos, silenciosos demais.

E Arcoverde, mais uma vez, escuta esse silêncio gritar.

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