O
presidente, um ex-presidente e uma ex-diretora da Companhia Pernambucana de
Saneamento (Compesa) foram condenados pela Justiça Federal por improbidade
administrativa no uso de verbas federais para uma obra de abastecimento no
Grande Recife. Também foi condenado o consórcio formado pelas empreiteiras
Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão, por causa de superfaturamento.
O
caso tem relação, segundo a Justiça Federal, com sobrepreço e irregularidades
na licitação do Sistema Produtor de Pirapama, no Cabo de Santo Agostinho.
Os réus, pessoas físicas e jurídicas, são obrigados a devolver, juntos, R$ 89,5
milhões aos cofres públicos.
As
pessoas físicas perderam direitos políticos e devem pagar multas, que variam de
acordo com o cargo de ocupavam na estatal. As construtoras terão que pagar R$
15 milhões de multa, cada uma.
A
sentença de primeira instância foi assinada pelo juiz da 35ª Vara da Justiça
Federal em Pernambuco, Rodrigo Vasconcelos Coelho de Araújo, no dia 27 de
julho. Todos podem recorrer da decisão junto ao Tribunal Regional Federal da 5ª
Região. Por meio de nota, o TRF informou, nesta quinta (18), que nenhuma das
partes envolvidas havia entrado com recursos na segunda instância.
Entre
os réus que atuavam na Compesa estão o atual presidente da estatal, Roberto
Cavalcanti Tavares, o ex-titular da empresa João Bosco de Almeida e a
ex-diretora de Engenharia Ana Maria Torres Pontes.
Punições
Na
sentença, o magistrado aponta que as construtoras receberam pagamentos
indevidos. “Restou comprovado que os réus se beneficiaram de forma ilícita e
dolosa ao receberem o pagamento pelos tubos de ferro fundido e de aço carbono
com sobrepreço”, afirma o texto.
De
acordo com a Justiça Federal, as três empresas também estão proibidas de
receber incentivos fiscais por cinco anos. O juiz também individualizou as
condutas de cada um dos envolvidos na Compesa.
Por
ter assinado os contratos, como presidente da estatal à época, João Bosco de
Almeida é apontado pela como responsável “por fraudar” o caráter competitivo da
licitação. “O dolo restou evidenciado pelo fato de ter autorizado a abertura do
processo licitatório e de ter adjudicado o objeto da licitação à empresa
vencedora, mesmo sabendo do sobrepreço dos tubos de aço e de ferro”, afirma o
texto do magistrado.
Ao
falar sobre a conduta de Almeida, o juiz acrescenta que "pela sua atuação
profissional ao longo dos anos - ocupando cargos relevantes - possuía
inquestionável conhecimento sobre as condições de mercado desses insumos e do
grande percentual de desconto que a aquisição em quantidade desses tubos proporciona".
Além
de ter que ressarcir os cofres públicos, de forma solidária com os demais réus,
Almeida teve os direitos políticos suspensos por oitos anos e deve pagar multa
de 50 vezes o valor recebido como remuneração por ocupar o cargo de presidente
da estatal.
Roberto
Tavares, atual presidente da Compesa, de acordo com o magistrado, também deverá
participar do ressarcimento aos cofres públicos. Ele teve os direitos políticos
suspensos por cinco anos e deve pagar multa de 25 vezes o valor da última
remuneração na empresa. Essa punição é igual para Ana Maria Torres.
Investigação
De
acordo com a Justiça Federal, o inquérito teve início a partir de um aviso do
Tribunal de Contas da União (TCU). O projeto do Sistema de Pirapama, no Cabo de
Santo Agostinho, recebeu do governo federal, inicialmente, R$ 479.011.238,66.
O
contrato nº 07.0.0467 foi firmado, em 2007, pela estatal e pelo consórcio
formado pelas três empreiteiras. Para esse contrato, a União repassou R$
430.092.831,23.
A
Justiça Federal informou que o acordo entre a Compesa e as construtoras previa
a assinatura de contrato por regime de empreitada por preços unitários, das
obras e serviços. Entre as ações estava o fornecimento de materiais e
equipamentos.
Ainda
de acordo com a sentença, antes da abertura da licitação, o edital
regulamentador foi objeto de análise pelo Tribunal de Contas do Estado de
Pernambuco (TCE-PE).
O
tribunal, então, produziu um relatório de auditoria e constatou problemas, como
a inadequação da realização de licitação única para serviços e compra de
tubulações.
A
Justiça Federal aponta, ainda, que as autoridades foram alertadas para o
problema. Mesmo assim, teve início a obra prevista no contrato, que passou pela
análise do TCU.
O
Tribunal, segundo a Justiça Federal, registrou sobrepreço na aquisição de tubos
em aço carbono e ferro fundido e na execução das obras e serviços de
engenharia.
A
Justiça Federal informa, ainda, que o relatório do TCU “enfatiza a existência
de itens com sobrepreço da ordem de 50% do valor contratado, sendo apurado,
após a realização de várias análises pela Secretaria de Controle Externo
(Secex-PE), inclusive com a apresentação de defesas pelo então presidente da
Compesa e pelo consórcio”.
No
histórico da tramitação do processo, a Justiça Federal informa que foram
apresentados direitos de defesa aos representantes da Compesa e das construtoras.
Entre eles, aparecem Marcelo Odebrecht e José Adelmário Pinheiro
Filho, conhecido como Leo Pinheiro, da Odebrecht, que foram presos pela Operação
Lava Jato.
Delações
Em
abril de 2017, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto em um
acidente de avião em 2014, foi citado em delações premiadas enviadas
pela Procuradoria-Geral da República ao ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo
Tribunal Federal (STF). Na petição 6.724, o delator João Antônio Pacífico
Ferreira, ex-diretor da Odebrecht, falou sobre um esquema de fixação artificial
de preços na obra de Pirapama.
Segundo
os relatos, diversas empresas abusaram de seu poder econômico e formaram ajuste
para fixar artificialmente preços e controlar o mercado na obra.
Há
menção de que Campos tinha ciência do ajuste, consentiu e, possivelmente, agiu
para a concretização, segundo os depoimentos. Carlos Fernando do Vale Angeiras,
subordinado à época de Pacífico, reforçou os relatos em sua delação premiada.
Respostas
O
Presidente da Compesa, Roberto Tavares, o ex-presidente João Bosco de Almeida e
a ex-diretora de Engenharia Ana Maria Torres afirmam, por meio de nota, que a
ação de improbidade que tramita na 35ª Vara Federal do Cabo de Santo Agostinho
teve origem em relatório preliminar do Tribunal de Contas da União que analisa
preços supostamente superiores ao mercado, na aquisição de tubos de ferro e de
aço no contrato relativo à obra do Sistema de Pirapama.
No
âmbito do TCU, segundo a Compesa, a auditoria em questão ainda não foi
concluída, em virtude da defesa apresentada pela companhia. A empresa destacou
que não há decisão final do TCU que confirme as suspeitas relativas a eventual
irregularidade no contrato.
O
texto afirma, ainda, que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região reformou
decisão anterior do mesmo juiz, que havia decretado a indisponibilidade de bens
dos gestores nesse mesmo processo, afastando a responsabilidade dos dirigentes
da Compesa, decisão esta que foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça
(STJ), por unanimidade.
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