sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Justiça Federal condena dirigentes da Compesa por improbidade administrativa e pede devolução de R$ 89 milhões


         O presidente, um ex-presidente e uma ex-diretora da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) foram condenados pela Justiça Federal por improbidade administrativa no uso de verbas federais para uma obra de abastecimento no Grande Recife. Também foi condenado o consórcio formado pelas empreiteiras Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão, por causa de superfaturamento.

O caso tem relação, segundo a Justiça Federal, com sobrepreço e irregularidades na licitação do Sistema Produtor de Pirapama, no Cabo de Santo Agostinho. Os réus, pessoas físicas e jurídicas, são obrigados a devolver, juntos, R$ 89,5 milhões aos cofres públicos.

As pessoas físicas perderam direitos políticos e devem pagar multas, que variam de acordo com o cargo de ocupavam na estatal. As construtoras terão que pagar R$ 15 milhões de multa, cada uma.

A sentença de primeira instância foi assinada pelo juiz da 35ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, Rodrigo Vasconcelos Coelho de Araújo, no dia 27 de julho. Todos podem recorrer da decisão junto ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Por meio de nota, o TRF informou, nesta quinta (18), que nenhuma das partes envolvidas havia entrado com recursos na segunda instância.

Entre os réus que atuavam na Compesa estão o atual presidente da estatal, Roberto Cavalcanti Tavares, o ex-titular da empresa João Bosco de Almeida e a ex-diretora de Engenharia Ana Maria Torres Pontes.

Punições

Na sentença, o magistrado aponta que as construtoras receberam pagamentos indevidos. “Restou comprovado que os réus se beneficiaram de forma ilícita e dolosa ao receberem o pagamento pelos tubos de ferro fundido e de aço carbono com sobrepreço”, afirma o texto.

De acordo com a Justiça Federal, as três empresas também estão proibidas de receber incentivos fiscais por cinco anos. O juiz também individualizou as condutas de cada um dos envolvidos na Compesa.

Por ter assinado os contratos, como presidente da estatal à época, João Bosco de Almeida é apontado pela como responsável “por fraudar” o caráter competitivo da licitação. “O dolo restou evidenciado pelo fato de ter autorizado a abertura do processo licitatório e de ter adjudicado o objeto da licitação à empresa vencedora, mesmo sabendo do sobrepreço dos tubos de aço e de ferro”, afirma o texto do magistrado.

Ao falar sobre a conduta de Almeida, o juiz acrescenta que "pela sua atuação profissional ao longo dos anos - ocupando cargos relevantes - possuía inquestionável conhecimento sobre as condições de mercado desses insumos e do grande percentual de desconto que a aquisição em quantidade desses tubos proporciona".

Além de ter que ressarcir os cofres públicos, de forma solidária com os demais réus, Almeida teve os direitos políticos suspensos por oitos anos e deve pagar multa de 50 vezes o valor recebido como remuneração por ocupar o cargo de presidente da estatal.

Roberto Tavares, atual presidente da Compesa, de acordo com o magistrado, também deverá participar do ressarcimento aos cofres públicos. Ele teve os direitos políticos suspensos por cinco anos e deve pagar multa de 25 vezes o valor da última remuneração na empresa. Essa punição é igual para Ana Maria Torres.

Investigação

De acordo com a Justiça Federal, o inquérito teve início a partir de um aviso do Tribunal de Contas da União (TCU). O projeto do Sistema de Pirapama, no Cabo de Santo Agostinho, recebeu do governo federal, inicialmente, R$ 479.011.238,66.

O contrato nº 07.0.0467 foi firmado, em 2007, pela estatal e pelo consórcio formado pelas três empreiteiras. Para esse contrato, a União repassou R$ 430.092.831,23.


A Justiça Federal informou que o acordo entre a Compesa e as construtoras previa a assinatura de contrato por regime de empreitada por preços unitários, das obras e serviços. Entre as ações estava o fornecimento de materiais e equipamentos.

Ainda de acordo com a sentença, antes da abertura da licitação, o edital regulamentador foi objeto de análise pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE).

O tribunal, então, produziu um relatório de auditoria e constatou problemas, como a inadequação da realização de licitação única para serviços e compra de tubulações.

A Justiça Federal aponta, ainda, que as autoridades foram alertadas para o problema. Mesmo assim, teve início a obra prevista no contrato, que passou pela análise do TCU.

O Tribunal, segundo a Justiça Federal, registrou sobrepreço na aquisição de tubos em aço carbono e ferro fundido e na execução das obras e serviços de engenharia.

A Justiça Federal informa, ainda, que o relatório do TCU “enfatiza a existência de itens com sobrepreço da ordem de 50% do valor contratado, sendo apurado, após a realização de várias análises pela Secretaria de Controle Externo (Secex-PE), inclusive com a apresentação de defesas pelo então presidente da Compesa e pelo consórcio”.

No histórico da tramitação do processo, a Justiça Federal informa que foram apresentados direitos de defesa aos representantes da Compesa e das construtoras. Entre eles, aparecem Marcelo Odebrecht e José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Leo Pinheiro, da Odebrecht, que foram presos pela Operação Lava Jato.

Delações

Em abril de 2017, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto em um acidente de avião em 2014, foi citado em delações premiadas enviadas pela Procuradoria-Geral da República ao ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na petição 6.724, o delator João Antônio Pacífico Ferreira, ex-diretor da Odebrecht, falou sobre um esquema de fixação artificial de preços na obra de Pirapama.

Segundo os relatos, diversas empresas abusaram de seu poder econômico e formaram ajuste para fixar artificialmente preços e controlar o mercado na obra.
Há menção de que Campos tinha ciência do ajuste, consentiu e, possivelmente, agiu para a concretização, segundo os depoimentos. Carlos Fernando do Vale Angeiras, subordinado à época de Pacífico, reforçou os relatos em sua delação premiada.

Respostas

O Presidente da Compesa, Roberto Tavares, o ex-presidente João Bosco de Almeida e a ex-diretora de Engenharia Ana Maria Torres afirmam, por meio de nota, que a ação de improbidade que tramita na 35ª Vara Federal do Cabo de Santo Agostinho teve origem em relatório preliminar do Tribunal de Contas da União que analisa preços supostamente superiores ao mercado, na aquisição de tubos de ferro e de aço no contrato relativo à obra do Sistema de Pirapama.

No âmbito do TCU, segundo a Compesa, a auditoria em questão ainda não foi concluída, em virtude da defesa apresentada pela companhia. A empresa destacou que não há decisão final do TCU que confirme as suspeitas relativas a eventual irregularidade no contrato.

O texto afirma, ainda, que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região reformou decisão anterior do mesmo juiz, que havia decretado a indisponibilidade de bens dos gestores nesse mesmo processo, afastando a responsabilidade dos dirigentes da Compesa, decisão esta que foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário